Na medida em que valores humanos são
recuperados, a necessidade das pessoas buscarem no mundo externo representações
de suas personalidades torna-se menos premente. No Brasil, vemos ainda
dominante a noção de que o que me pertence me representa – portanto, um carro
bonito, novo e potente projeta seu proprietário junto aos demais como alguém
jovem, de boa aparência e igualmente potente, afirmando seu status em seu meio
social e preenchendo seu ego com os suspiros da inveja alheia.
Essa é apenas uma dentre as muitas razões que
tornam a realidade brasileira ainda distante daquela de muitos outros países,
onde políticos, médicos, cientistas, músicos de orquestras sinfônicas, grandes
empresários realizam seus deslocamentos diários alternando transporte público,
bicicleta, carro e caminhada, ao sabor das necessidades do momento, sem que
isso arranhe minimamente sua autoestima ou a forma como eles são vistos pelas
demais pessoas.
Dito isso, fica claro o quanto a
intermodalidade – que nada mais é do que utilizar diferentes modais de
transporte – está distante da vivência das nossas cidades. O transporte
público, muitas vezes caro, insuficiente e desconfortável – é relegado a quem
não tem condições financeiras de se propiciar um veículo automotor individual.
A explosão do número de motocicletas se insere nessa lógica de coisificação do
indivíduo, aliando à agilidade característica do veículo a economia que o torna
acessível a muita gente e o status do proprietário que adquire um “bem” – ainda
que muito mal advenha dessa escalada numérica, com crescimento proporcional na
quantidade de mortos e sequelados.
O DETRAN encerrou sua participação na Semana
Nacional de Trânsito com um Desafio Intermodal – atividade em que um grupo de
pessoas desloca-se do ponto A ao ponto B utilizando diferentes modais de
transporte. Mais uma vez, a bicicleta chegou na frente, para espanto de muitos.
Surpresa que por si só já mostra que temos muito esclarecimento a levar ao
público sobre as características de cada modal. Procuramos cumprir nosso papel
informando, mas mais do que isso, estamos demonstrando que o meio de transporte
escolhido nada tem a ver com o valor do ser humano que dele faz uso.
Por* Ildo Mário
Szinvelksi, Diretor-Geral do DETRAN